O Brasil enxerga uma janela de oportunidade para expandir suas exportações para a China, especialmente em meio às tensões comerciais entre os Estados Unidos e o governo chinês. As tarifas impostas pela administração do presidente Donald Trump sobre produtos de países como China, Canadá e México têm gerado um cenário favorável para que o Brasil possa elevar suas vendas de commodities, como frango, carne e soja, ao gigante asiático.
No entanto, a possibilidade de novas tarifas sobre aço e alumínio, que podem ser implementadas pelo governo dos EUA, preocupa as autoridades brasileiras. A taxação de alimentos americanos planejada pela China pode, em um primeiro momento, abrir espaço para o Brasil, que se tornaria uma alternativa para suprir a demanda chinesa por esses produtos.
O governo brasileiro está monitorando atentamente a situação. Embora a aplicação das tarifas americanas não tenha um impacto direto sobre o Brasil, as movimentações comerciais globais podem abrir novas oportunidades para os produtos brasileiros. Ao mesmo tempo, a ameaça de tarifas adicionais afeta o ambiente de negócios e gera incertezas.
Segundo André Galhardo, economista da consultoria Análise Econômica, a capacidade do Brasil de atender a um aumento na demanda chinesa depende de diversos fatores, incluindo o andamento do conflito entre Rússia e Ucrânia. "Se estivermos próximos a um acordo de paz, isso poderá reduzir os preços dos insumos, como fertilizantes, e aumentar nossa oferta a médio e longo prazo", aponta Galhardo.
Contudo, José Augusto de Castro, presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), ressalta que qualquer ganho nessa área pode ser temporário. Assim que um dos principais produtores de soja, carne bovina e frango, como os EUA, enfrenta dificuldades, a tendência é que compradores busquem alternativas, mas essas situações costumam ser passageiras. Ele afirma: "As medidas comerciais são constantemente revisadas e, considerando a importância econômica dos EUA e da China, é provável que ajustes ocorram rapidamente".
No caso de um aumento significativo nas exportações brasileiras, isso poderia levar a uma pressão sobre a oferta interna, resultando em aumento de preços e, potencialmente, em inflação. Galhardo acredita que as chances de isso ocorrer são reduzidas, já que um crescimento nas exportações seria gradual.
Conforme pessoas envolvidas nas negociações entre o governo brasileiro e o setor privado, as tarifas dos EUA não devem impactar os preços dos alimentos imediatamente no Brasil. Reuniões estão em andamento para discutir medidas que possam aliviar a pressão sobre os consumidores.
A imprevisibilidade do cenário atual exige cautela do Brasil. "Precisamos manter uma posição neutra. Até agora, a Europa, que possui mais peso político e econômico que o Brasil, também não se posicionou de forma clara. O ideal é evitar declarações que possam ser vistas como um alinhamento com um dos lados", destaca José Augusto.
De acordo com representantes do Itamaraty, é necessário um tempo para avaliar as repercussões no comércio global. Existe, ainda, preocupação em relação à tarifa de 25% sobre as importações de aço e alumínio, que deverá ser implementada no dia 12 deste mês. O Brasil foi o segundo maior fornecedor de aço ao mercado norte-americano em 2024, atrás apenas do Canadá.
O governo brasileiro está em busca de um diálogo com a administração Trump. O vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Comércio e Indústria, Geraldo Alckmin, solicitou uma conversa com o secretário de Comércio, Howard Lutnick, que estava programada para a última sexta-feira, mas deve ser agendada para os próximos dias.
Uma das propostas em análise pelo governo brasileiro é a redução das tarifas de importação do etanol como uma forma de negociação contra a taxação do aço e do alumínio.
A indústria automotiva é uma das mais impactadas pelas tarifas de Trump, já que metade dos carros leves vendidos nos EUA em 2024 é de origem importada, sendo muitos deles do México e do Canadá. Recentemente, esses produtos passaram a ser taxados em 25%. Bruno Corano, economista da Corano Capital, acredita que o Brasil pode até se beneficiar com a exportação de veículos para os EUA, mas ressalta que essa vantagem pode ser limitada pelos altos custos de produção.
Corano esclarece que a interdependência no setor automotivo torna difícil a substituição de modelos fabricados no México pelos produzidos no Brasil em curto prazo, o que pode complicar as operações de diversos fabricantes. Além disso, o aumento dos custos das autopeças do México pode criar um efeito dominó na cadeia de suprimentos automobilística global, que afetará os preços em escala mundial.
Por fim, o economista acredita que as tarifas comerciais impostas por Trump não devem permanecer por muito tempo. "As tarifas do primeiro governo Trump duraram apenas quatro meses, o que sugere que essas ações são mais uma estratégia de negociação do que um método eficaz para arrecadação real para os EUA", finaliza Corano.