No culto realizado no dia 16 de fevereiro, o pastor Paulo Tenório subiu ao púlpito da igreja pentecostal brasileira The Growing Church, localizada em Massachusetts, e compartilhou uma mensagem sobre "o medo que leva ao esconderijo". Através de passagens bíblicas, ele fez um apelo à comunidade brasileira para permanecer firme em meio aos desafios impostos pelas políticas de imigração do novo governo americano. "As medidas de [Donald] Trump trouxeram muito abalo para as pessoas. Uma coisa muito difícil está sendo vivida aqui", afirmou Tenório à BBC News Brasil, referindo-se ao endurecimento das políticas migratórias.
A comunidade brasileira nos EUA, que conta com cerca de dois milhões de imigrantes, se concentra principalmente em Massachusetts e Flórida. A recente administração de Trump tomou medidas drásticas, prometendo a maior deportação da história do país, onde a estimativa é que existam 12 milhões de imigrantes em situação irregular, entre os quais pelo menos 230 mil são brasileiros, segundo o Pew Research Center.
Com a retórica de que a imigração estava fora de controle, Trump e sua administração mudaram as regras, revogando a proteção para locais como escolas e igrejas, onde tradicionalmente os imigrantes buscavam refúgio. "Os criminosos não poderão mais se esconder nas escolas e igrejas da América para evitar a prisão", declarou um porta-voz do Departamento de Segurança Interna (DHS) ao anunciar essas mudanças.
Com as operações de imigração se intensificando, o clima de pânico tomou conta da comunidade evangélica brasileira, levando pastores a buscar apoio legal para seus fiéis. A Igreja Presbiteriana CTK United, por exemplo, adotou um orçamento mensal que inclui a contratação de advogados especializados em imigração. O pastor Pedro Lino, da igreja, relatou que muitos frequentadores agora se perguntam para onde seus filhos iriam se eles fossem presos e deportados.
Um exemplo disso é a Waves of Revival, dirigida pelo pastor Júnior Ramos, que viu a frequência de sua congregação cair em 30% nas semanas seguintes à vitória de Trump. De acordo com Ramos, pelo menos 12 famílias assinaram documentos que permitem a ele assumir a guarda de seus filhos no caso de detenções.
A insegurança generalizada tem levado os pastores a se prepararem para possíveis ações do ICE (Serviço de Imigração e Alfândega). Em uma reunião liderada pela Associação de Pastores de Orlando, advogados foram convocados para esclarecer os procedimentos em caso de batidas nas igrejas. O presidente da associação, pastor André Loyola, informa que até o momento, não houve ocorrências desse tipo em templos da região, mas é essencial estar preparado para um cenário que poderia gerar grande tensão.
A constituição dos EUA garante a proteção dos cultos religiosas, mas as incertezas levam muitos pastores a reavaliar como proceder caso uma batida aconteça. Loyola sugere que membros bilíngues sejam treinados para lidar com agentes do governo, mantendo a calma e a colaboração, sem causar pânico entre os fiéis.
A pesar das dificuldades, muitos pastores evangélicos brasileiros, como Leidmar Lopes, expressam apoio às iniciativas do governo Trump, acreditando que as leis precisam ser cumpridas. Lopes, um influente líder entre os evangélicos, já colaborou com o recém-criado Escritório da Fé ligado à Casa Branca, que visa lidar com a discriminação contra cristãos e promover políticas relacionadas à adoção e combate às drogas.
Contudo, o apoio à administração não é unânime. O pastor Lino reflete sobre a realidade dos milhões de imigrantes, afirmando que muitos deles são seres humanos dignos que contribuem para a sociedade. Ele expressa que "o primeiro imigrante sem documentos foi Abraão", contextualizando a história bíblica que reforça a necessidade de compreendê-los.
Entre os pastores, alguns se mostram preocupados que a política de deportações se torne seletiva, atingindo mais os imigrantes sem ficha criminal. O pastor Samuel Vitalino, da Igreja Esperança BPC, alarmou sobre os danos colaterais das detenções, que incluem pessoas como Lucas Amaral, um cantor gospel brasileiro que passou mais de um mês preso após ser pego em uma blitz do ICE.
As pesquisas eleitorais indicam que o apoio de evangélicos a Trump permanece significativo, com 81% dos evangélicos brancos e 63% dos evangélicos hispânicos tendo votado nele nas últimas eleições. Contudo, a situação é tensa e muitos se mostram relutantes em expressar suas preocupações, enquanto ainda na comunidade, líderes como pastor Ramos se perguntam se Trump foi realmente a melhor escolha para os imigrantes evangélicos.
Enquanto os desafios políticos e sociais intensificam-se para os imigrantes, a fé continua a ser a base de suporte para muitos. Os líderes religiosos insistem na necessidade de compaixão e compreensão, lembrando que a verdadeira essência do cristianismo requer amor ao próximo, independentemente de sua situação legal. O pastor Tenório resume essa filosofia ao afirmar que "o primeiro imigrante sem documentos foi Abraão, quando Deus falou: 'Sai da terra para um lugar que vou te mostrar'."