Durante quase cinco anos, a atuação de Sumaya, uma psicóloga numa clínica de caridade no noroeste da Síria, foi vital para muitas vítimas da guerra civil que assola o país. Ela ofereceu consolo a pacientes que sofreram com depressão e tentativas de suicídio após anos de deslocamento e trauma. Porém, a situação mudou drasticamente em 20 de janeiro, quando o presidente dos EUA, Donald Trump, decidiu interromper a ajuda financeira que sustentava a clínica localizada em Sarmada.
Com essa suspensão abrupta da assistência, que durou 90 dias, diversas organizações passaram a enfrentar graves consequências. Isso incluiu a Médicos do Mundo, uma ONG francesa, que foi forçada a fechar 12 das suas 17 clínicas de saúde primária na Síria, além de demitir 280 de seus 350 funcionários. Hakan Bilgin, diretor da organização na Turquia, enfatizou que a maioria dos empregados era composta por cidadãos sírios que, devido à guerra, já enfrentavam longos períodos de deslocamento. “Sem esses salários, a crise vai se agravar”, alertou.
Os cortes na assistência dos EUA não apenas deixaram milhões sem socorro vital, como também resultaram na perda de empregos para centenas de milhares. Desde países como Haiti e El Salvador até na Nigéria, Quênia, Síria e Afeganistão, profissionais diversos, como administradores e conselheiros, estão sofrendo as consequências direto da interrupção de financiamento da USAID.
Uma trabalhadora humanitária em Porto Príncipe, o qual preferiu não revelar o sobrenome, disse que sua posição a deixou alarmada com a possibilidade de que seu programa focado no empoderamento de mulheres fosse cancelado permanentemente. “Na verdade, é um pânico total na organização. As pessoas começaram a se preocupar se conseguirão alimentar suas famílias”, desabafou.
Os relatos de dificuldades foram comuns entre os trabalhadores do setor. Muitos agora enfrentam a dura realidade de fazer cortes significativos em suas despesas para a sobrevivência. Isso inclui a suspensão de compras de alimentos considerados mais caros e até o retorno de crianças às escolas por não conseguirem arcar com as taxas. Uma agente de saúde comunitária em Nairóbi, que não quis se identificar, questionou a lógica por trás das decisões de emprego. “Como pode ser que a equipe da USAID esteja sendo colocada em licença, mas nós, que dependemos de nossos empregos, somos dispensados? A maneira como tudo isso foi feito não é justa”, reclamou.
Na Nigéria, a situação é semelhante. O congelamento do financiamento da USAID provocou demissões em massa em consultorias e ONGs, impactando fortemente os serviços de saúde, especialmente nas áreas de tratamento do HIV, que são sustentados em 90% pela agência americana. O governo nigeriano anunciou um investimento de US$ 200 milhões para preencher as lacunas criadas, mas a preocupação de conseguidor novos profissionais demitidos persiste. “A falta de assistência pode agravar a crise de saúde mental numa região já devastada por insurgentes”, alertou Nixon Ayuba, gerente de projeto na Alliance for Health and Rights Advancement Initiative.
Os Estados Unidos são conhecidos por serem o maior doador de ajuda internacional, e em 2023 a Agência dos EUA para o Desenvolvimento Internacional (USAID) desembolsou cerca de US$ 42 bilhões em iniciativas que vão da prevenção de doenças à assistência humanitária. Entretanto, a administração Trump optou por revisar e desmantelar muitas dessas iniciativas, apontando a necessidade de reformulação. Tronando-se assim um tema amplamente discutido desde que Trump caracterizou a USAID como uma entidade administrada por "lunáticos radicais de esquerda".
O clima de incerteza permeia diversas organizações, enquanto funcionários e beneficiários esperam uma resposta sobre a reativação dos programas suspensos. A angústia entre trabalhadores humanitários e a possibilidade de fechamento completo de serviços são preocupações tangíveis que se agravam a cada dia de espera. Todos estão ansiosos para que uma solução não apenas retorne a estabilidade, mas também dignidade às vidas daqueles que dependem dessa ajuda.
Embora as taxas de desemprego aumentem e as condições de vida se tornem insustentáveis para muitos, a esperança de um desfecho favorável ainda persiste entre os que buscam soluções. É preciso repensar a forma como a assistência internacional é gerida e garantir que as vidas de milhares não sejam jogadas à margem da sociedade devido a decisões administrativas.