A ausência de um consenso nas discussões referentes ao marco temporal está dificultando a homologação de um acordo no Supremo Tribunal Federal (STF). Com isso, cresce a expectativa de que o tema seja levado novamente a julgamento. A proposta do texto foi apresentada na última audiência de conciliação, conduzida pelo ministro Gilmar Mendes, ocorrida na segunda-feira (17). As partes envolvidas na discussão, representando tanto os povos indígenas quanto o agronegócio, saíram sem satisfações apalpáveis.
Uma nova audiência foi marcada para a próxima segunda-feira (24), mas as perspectivas de um acordo ainda são sombrias. Fontes que acompanham a situação afirmam que as partes permanecem irredutíveis, tomando posições inflexíveis sobre o assunto. Durante as conversações, o juiz auxiliar Diego Viegas Veras, que atua ao lado de Gilmar, mencionou que praticamente 94% dos dispositivos do texto foram “destacados” devido a dissensos entre as partes. “Sobrou ali talvez 5%”, estimou o magistrado.
“Isso demonstra duas coisas: a aridez do tema e a falta de disposição dos presentes para negociar. Está muito claro e evidente”, constatou o juiz durante a sessão. A proposta do marco temporal estabelece que apenas as terras já ocupadas por indígenas em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição, poderiam ser demarcadas. Em 2023, a interpretação foi considerada inconstitucional pelo STF, provocando uma reação do Congresso Nacional que aprovou uma lei para implementar o marco temporal, novamente judicializada.
Gilmar Mendes, ao invés de levar os casos imediatamente ao julgamento, decidiu criar uma comissão especial para tentar promover um acordo. As reuniões começaram em agosto do ano anterior, com previsão de término em dezembro, mas ainda sem resultados conclusivos. A minuta apresentada nesta semana sugere que a demarcação das terras indígenas não depende da data da Constituição, ou seja, contesta a tese do marco temporal. No entanto, o texto proposto abre espaço para a mineração em territórios indígenas.
O deputado Pedro Lupion (PP-PR), que preside a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), manifestou descontentamento: “O cerne de toda a questão é justamente o marco temporal, que foi completamente esquecido e ocultado”, afirmou. Por outro lado, o segmento sobre mineração surpreendeu o Ministério dos Povos Indígenas (MPI), que vê a atividade como prejudicial. De acordo com a pasta, essa temática não foi abordada pela comissão ao longo das últimas reuniões, não havendo uma “construção conjunta” nesse sentido.
A proposta impede a mineração sem a consulta prévia aos povos originários, mas permite que o presidente da República autorize a atividade mesmo diante da objeção da comunidade, caso comprove que há um interesse público e que a ação é imprescindível. Se não houver um acordo entre as partes, os casos serão levados ao julgamento no plenário, para um reexame da questão. O próprio presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso, já confirmou essa possibilidade: “Se não houver acordo, retomaremos a votação, pura e simplesmente”.
No entanto, Barroso ressaltou que “é necessário um esforço” e que “a procrastinação não é uma opção viável”. Nessa mesma linha, Gilmar Mendes tem afirmado que a conciliação representa “uma janela de pacificação histórica que deve ser aproveitada por todos os envolvidos”.