A era da influência americana na Europa parece estar chegando ao fim. Recentemente, a aproximação entre Donald Trump e Vladimir Putin, ambos líderes que estão cercados por polêmicas, promete transformar as dinâmicas por trás das relações transatlânticas. Durante uma reunião na quarta-feira (12), os presidentes dos EUA e Rússia estabeleceram um contato mais próximo, concordando em promover visitas presidenciais, enquanto ambos os lados trabalham em estratégias para resolver a crise na Ucrânia. Em Bruxelas, Pete Hegseth, secretário de Defesa dos Estados Unidos, pediu aos países europeus que ''assumam a responsabilidade pela segurança convencional no continente'', destacando a nova abordagem que vai de encontro à ideologia de ''America First'' de Trump.
A história nos mostra que as intervenções americanas foram fundamentais para a vitória em duas guerras mundiais e para a proteção da Europa da ameaça soviética. Contudo, na campanha presidencial, Trump já havia insinuado que poderia não defender aliados que não aportassem recursos adequados para a defesa. Ele trouxe à tona uma reflexão de Winston Churchill ao dizer que o Novo Mundo não se apressaria a resgatar o Velho, reforçando uma postura de cautela em questões externas ao afirmar que ''temos uma coisinha chamada oceano no meio''.
As novas exigências norte-americanas revelam um cenário complicado para governos europeus que priorizaram gastos sociais em detrimento da segurança militar. O secretário-geral da OTAN, Mark Rutte, destacou a necessidade de um aumento significativo nos orçamentos de defesa. ''Se vocês não fizerem isso, façam seus cursos de russo ou vão para a Nova Zelândia'', alertou Rutte. Este novo tom por parte de Hegseth, que formalizou a demanda de Trump por gastos de defesa de 5% do PIB, aponta para uma mudança de prioridades dos Estados Unidos, que agora priorizarão a concorrência com a China e a segurança interna em detrimento das preocupações europeias.
A abordagem de Trump reflete uma realidade política completamente alterada. A geração que enfrentou a Segunda Guerra Mundial se foi, e os cidadãos americanos que vivenciaram a Guerra Fria estão, na sua maioria, na faixa dos 50 anos ou mais. Portanto, surge a pergunta: por que a Europa ainda não se preparou para sua própria autodefesa, 80 anos após a derrota dos nazistas?
Historicamente, líderes de Estados Unidos e Europa não se adaptaram às novas realidades da OTAN no século 21. Com o crescente pragmatismo nacionalista de Trump, as relações têm sido colocadas em uma nova perspectiva. O secretário de Estado, Marco Rubio, em entrevista ao ''The Megyn Kelly Show'', sugeriu que os EUA não deveriam ser a ''ponta de frente'' da segurança europeia, mas atuarem como a ''ponta de trás''. Ele criticou a atenção europeia à segurança nacional, lembrando que isso implicaria cortes em programas de bem-estar.
As táticas de Trump em relação a aliados, como o Canadá e o México, bem como seu histórico de propostas incomuns, como a entrega da Groenlândia à Dinamarca, revelam seu desprezo pela política externa multilateral tradicional dos EUA. Trump enaltece líderes como Putin e Xi Jinping por suas características assertivas, mirando em uma nova ordem global em que os EUA não toleram mais o que considera relações desequilibradas com os europeus. ''A agenda de Trump não se trata apenas da segurança europeia, mas da convicção de que os EUA não deveriam arcar com esses custos'', afirma Nicholas Dungan, fundador da CogitoPraxis.
A Ucrânia será o primeiro teste prático desta nova dinâmica EUA-Europa. Trump anunciou que as conversas para finalizar a guerra na Ucrânia devem começar imediatamente após sua interação com Putin, um contato que até agora foi visto com ceticismo pelo Ocidente. O presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, foi deixado de fora dessas discussões, o que pode ter consequências significativas para a sua administração. Ao ser questionado sobre o papel da Ucrânia nas negociações de paz, Trump comentou: ''É uma questão interessante'' e pareceu ponderar suas palavras antes de se referir ao conflito como ''uma guerra não boa para se entrar''.
As propostas apresentadas por Hegseth delineiam que a Ucrânia não poderia retornar a suas fronteiras pré-2014 e que tropas americanas não fariam parte de qualquer missão de segurança que viabilizasse a paz. Qualquer força de manutenção da paz deverá ser composta por tropas europeias, claramente sinalizando que os EUA não intervirão em caso de um confronto com a Rússia. Assim como a administração anterior, Trump hegemônica fez questão de deixar claro que o apoio contínuo à Ucrânia seria diferente do que muitos esperam.
Além disso, a reunião dos líderes chamou a atenção da Europa, onde várias nações emitiram declarações alertando sobre os riscos de exclusão na tentativa de se chegar a um acordo de paz. França, Alemanha, Polônia, Itália, Espanha, União Europeia, Comissão Europeia, Reino Unido e Ucrânia enfatizaram que quaisquer negociações devem incluir tanto a Ucrânia quanto a Europa, reafirmando que uma paz justa e duradoura é pré-condição para a segurança transatlântica consistente.
A frase de Carl Bildt, ex-primeiro-ministro sueco, ecoa inquietação: ''Para os ouvidos europeus, isso soa como Munique''. Ele evocou as memórias da política de apaziguamento, parecendo prever que grandes líderes buscarão acordos às custas de países menores, uma vez que Trump e Putin sinalizam uma nova era de decisões unilaterais. Enquanto o futuro é incerto e a posição estratégica da Ucrânia é delicada, o que está claro é que a geopolítica europeia pode estar a ponto de vivenciar uma reviravolta sem precedentes.