Em uma recente entrevista à CNN, o ministro Gilmar Mendes, decano do Supremo Tribunal Federal (STF), comentou sobre a proposta de semipresidencialismo, deixando claro que essa mudança não transformaria o presidente da República em uma figura semelhante à "rainha da Inglaterra", que possui influência limitada. Mendes destacou que, de acordo com essa proposta, o Congresso Nacional teria um papel mais ativo e responsável na gestão dos recursos públicos.
O ministro afirmou: "Não se trata de rainha da Inglaterra. (O presidente) terá papéis importantíssimos. Pode ter grandes influências ou menos influência. Isso depende do perfil político da própria autoridade". A proposta de semipresidencialismo, que ainda precisa do apoio do Congresso, prevê que o presidente da República exerceria um papel mais representativo, semelhante ao de um chefe de Estado, enquanto o Parlamento seria responsável por escolher um primeiro-ministro que atuaria como chefe de Governo.
Ao abordar a nova dinâmica de poder, Mendes ressaltou: "O Congresso ficou muito forte e nós estamos vendo agora no debate sobre as emendas que eles (parlamentares) assumem papel de gestores. Então, neste contexto, seria recomendado que se discutisse a ideia de um modelo semipresidencial em que o presidente teria algumas funções, poderia, por exemplo, ser chefe das Forças Armadas, eventualmente responsável pelos negócios estrangeiros." Isso implica que as funções governativas ficariam sob a responsabilidade da maioria no Congresso, que poderia estabelecer um contrato de coalizão com um programa de governo.
Mendes, que é um dos principais defensores da adoção do semipresidencialismo no Brasil, argumentou que essa reforma não apenas reforçaria a responsabilidade do Congresso, mas também permitiria que os parlamentares enfrentassem as consequências de suas decisões: "Nas emendas, os parlamentares transferem o cheque, hoje o PIX, e não têm responsabilidade nenhuma sobre a política pública que eventualmente está se desenhando".
Os apoiadores do semipresidencialismo acreditam que essa mudança poderia ajudar a pacificar as tensões entre os diferentes Poderes da República e reduzir os riscos de novos processos de impeachment presidencial. Mendes destacou: "A pressão pesaria sobre o primeiro-ministro, escolhido pelo Congresso, que fica suscetível ao impeachment, se virar alvo de uma moção da maioria do Parlamento contra ele".
Além disso, o ministro enfatizou que essa nova configuração também exigiria que o eleitorado estivesse mais atento às qualidades dos candidatos que elegeriam. "Nós eleitores vamos olhar com mais cuidado porque eventualmente estamos elegendo um deputado que pode ser primeiro-ministro. Portanto, vamos estar atentos às qualidades de quem vamos eleger. O parlamentar também saberá que ele precisa se qualificar para essa função"," disse Mendes.
Mendes ainda avaliou o contexto político brasileiro, mencionado a instabilidade que os presidentes enfrentaram nos últimos anos: "A gente tem vivido muitas crises com os vários presidentes (da República) que tivemos. Tivemos dois impeachments presidenciais. Isso é um sinal de instabilidade do sistema." Ele observou que muitas das crises não se devem apenas a gravíssimos crimes de responsabilidade, mas também à perda de apoio de seus pares no Congresso Nacional.
Embora veja o valor da discussão sobre o semipresidencialismo, o ministro acredita que sua aprovação não deve acontecer neste ano. Ele enfatizou que é crucial debater o tema em um contexto mais amplo: "Não se trata de aplicar isso de hoje para amanhã, de interromper mandatos presidenciais obtidos. Mas discutir isso dentro de um quadro de maior nacionalidade".
Gilmar Mendes também mencionou que nos dias seguintes receberá a visita do presidente de Portugal, Marcelo Rebelo, que já exerce o mandato sob um sistema semipresidencial. Mendes concluiu ressaltando que o modelo atual apresentado pelas emendas permite um envolvimento significativo dos deputados nas questões orçamentárias, mas com pouca responsabilidade: "O que não parece razoável é o estágio que estamos vivendo hoje em que o deputado tem uma participação enorme na questão orçamentária e nas políticas públicas desenhadas sem maiores responsabilidades".
Ele finalizou sugerindo que é hora de mudar esse cenário e promover um debate mais sério sobre a responsabilidade dos parlamentares no Brasil.