A barreira de corais entre Alagoas e Pernambuco, uma das maiores do mundo, está se transformando em um verdadeiro cemitério submerso. Com 130 km de extensão, a Área de Proteção Ambiental Costa dos Corais abriga uma rica biodiversidade, mas atualmente enfrenta graves ameaças devido ao aquecimento das águas, à poluição e ao turismo desordenado.
Entre setembro de 2023 e novembro de 2024, uma pesquisa meticulosa revelou uma mortalidade preocupante de até 80% dos corais monitorados. O professor Robson Santos, biólogo e coordenador do Laboratório de Ecologia e Conservação da Ufal, descreveu a situação como alarmante: "Algumas áreas realmente pareciam cemitérios. Foi o maior evento de mortalidade registrado até hoje na região".
De maneira a tentar salvar a Lagoa Azul, localizada em Maragogi e popularmente conhecida como o 'Caribe brasileiro', a Justiça tomou a decisão de proibir qualquer atividade turística na localidade. Essa ação ocorreu após denúncias do Ministério Público Federal (MPF), que alegou que a pressão humana estava comprometendo o ecossistema da região.
A Costa dos Corais representa a maior unidade de conservação costeiro-marinha do Brasil. Embora algumas atividades turísticas ainda sejam permitidas, elas precisam ser administradas de forma que preservem o ambiente natural, garantindo limites de carga para visitação e condições adequadas de infraestrutura.
Os dados coletados mostram que o problema não se restringe a Alagoas. Em Pernambuco, o doutor Pedro Pereira, da Universidade James Cook na Austrália, corroborou os achados: "Em todas as áreas que monitoramos, no mínimo 70% a 80% dos corais morreram".
O fenômeno do branqueamento dos corais, que ocorre devido ao aumento da temperatura da água e a eventos climáticos como o El Niño, torna os corais vulneráveis. Entre março e abril do último ano, a temperatura média global da superfície do mar aumentou quase 0,2ºC, o que intensificou essa crise.
Os recifes de corais exercem funções vitais como barreiras naturais e criadores de piscinas naturais, que atraem turistas. No entanto, a intensa visitação sem regulamentação exerce pressão adicional sobre esses ecossistemas já fragilizados, conforme explicou Robson Santos: "As atividades de turismo, se não reguladas, geram impactos diretos aos recifes, como o pisoteio e quebra de corais, além da poluição das águas".
A fiscalização é uma ferramenta crítica para garantir a proteção dessas áreas. O órgão responsável pela gestão e fiscalização da área é o ICMBio, que segue diretrizes estabelecidas por um Plano de Manejo.
Um ponto importante foi a criação da Área de Relevante Interesse Ecológico (ARIE) pela prefeitura de Maragogi, que permitia a exploração turística. No entanto, essa sobreposição de normas gerou cautela, levando a um monitoramento conjunto entre a esfera federal e municipal para assegurar a proteção dos ambientes aquáticos.
A prefeitura de Maragogi esclareceu que, embora as atividades na Lagoa Azul tenham sido suspensas, as demais piscinas naturais disponíveis continuam a receber turistas. A administração municipal, também se manifestou a respeito do recurso que pretende interpor em relação à limitação das atividades turísticas.
Enquanto a necessidade de regulamentação do turismo é crucial para a conservação ambiental, proteger a geração de renda local é um desafio complexo. Robson Santos enfatiza que, ao mesmo tempo em que é vital promover um turismo sustentável, economias locais dependem fortemente dessa atividade. "O turismo deve ser uma ferramenta de conservação, mas precisa ser adequadamente ordenado".
Na APA dos Corais, estratégias de turismo sustentável estão em implementação. Um exemplo é a Associação Peixe-Boi, que promove a educação ambiental e o turismo de observação em Porto de Pedras, envolvendo os moradores locais. Também foram introduzidas regras para limitar a visitação nas dunas em Piaçabuçu, onde guias são treinados para informar sobre a importância da preservação.
Esses modelos podem ser modelos replicáveis por toda a Costa dos Corais, demonstrando que o turismo sustentável precisa ser parte das políticas públicas. "É urgente implementar normas claras que respeitem os limites dos ecossistemas", afirmou o biólogo.
Apesar do cenário desolador, pesquisadores acreditam ser possível reverter a degradação com a ajuda de políticas eficazes. A recuperação dos corais é uma questão de ação coletiva, que envolve tanto a redução de impactos ambientais quanto a implementação de projetos de conservação.
“É imperativo, para a saúde da biodiversidade marinha e também para o turismo e pesca que sustentam a economia local, a criação de áreas marinhas protegidas e o monitoramento contínuo das condições dos recifes”, apelou o pesquisador Ricardo Robson. Com ações conjuntas e comprometidas, existe esperança de transformar esse cemitério submerso novamente em um vibrante ecossistema marinho.