Localizada na histórica Galeria do Rock, em São Paulo, a confecção de bonés tem ganhado destaque, especialmente por seu papel nas interações culturais e políticas brasileiras. Graziele Ferreira, comerciante com 15 anos de experiência nesse ramo, observa um aumento na demanda por bonés com frases impactantes, que refletem tendências atuais ou eventos notáveis na mídia.
Recentemente, pedidos por bonés em vermelho com o slogan da campanha de Donald Trump, "Faça a América Grande Novamente", e peças com frases como "A vida presta", proferida por Fernanda Torres após sua indicação ao Oscar, tornaram-se comuns. "Assim que algo se torna popular nas redes sociais ou nos noticiários, você pode apostar que logo aparecerá um boné com isso", comenta Graziele.
As últimas semanas evidenciaram a relevância do boné na política brasileira, especialmente no Congresso em Brasília. O fenômeno começou quando parlamentares do governo ostentaram um boné azul com a frase "O Brasil é dos brasileiros", em uma movimentação liderada pelo ministro Alexandre Padilha. Essa atitude surgiu após a troca de comando na Secretaria de Comunicação, cargo hoje ocupado por Sidônio Palmeira, responsável pela campanha de Lula em 2022. A escolha do azul e da frase reflete uma forte oposição ao boné vermelho que Tarcísio de Freitas usou durante sua posse como governador de São Paulo. No entanto, não demorou para que deputados bolsonaristas respondessem com bonés que traziam a frase "comida barata novamente", aludindo à inflação dos alimentos.
Esse cenário provocou uma verdadeira "guerra dos bonés", com um crescimento na busca por bonés políticos personalizados. Artur Pinheiro, sócio de uma das principais empresas do setor, a Seu Boné, destacou que, apesar da política não ser seu foco principal, a demanda por acessórios desse tipo cresce substancialmente.
O novo presidente da Câmara, Hugo Motta, criticou essa competição, afirmando que "boné serve para proteger a cabeça do sol, e não para resolver problemas do país". No entanto, essa visão ignora a rica história do boné e seu papel cultural. Gustavo Berti, pesquisador do Ecomuseu do Boné da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR), argumenta que o boné vai além de uma proteção física e é uma ferramenta de interação social.
Em Apucarana, conhecida como a "capital nacional dos bonés", concentrando 70% da produção nacional, a agilidade das fábricas tem sido crucial para a sobrevivência frente à concorrência estrangeira. Segundo Jayme Leonel, coordenador do Arranjo Produtivo Local (APL), a capacidade de produzir bonés sob demanda rapidamente tem mantido a indústria local forte: "Em cinco dias, conseguimos entregar o que a China levaria 40".
O boné surgiu como uma alternativa ao chapéu, utilizado desde a antiguidade. Sua popularidade nos EUA teve início no século 19, quando se tornou parte do vestuário dos jogadores de beisebol, garantindo proteção solar e estabilidade ao serem usados em campo. A partir do início do século 20, com a consolidação de indústrias como a New Era, a peça passou a ser símbolo de moda, especialmente com sua associação ao hip hop nos anos 1980.
Desde então, seu uso se expandiu globalmente, sendo requisitado tanto para eventos promocionais quanto na cultura pop. O caso de Ayrton Senna, que ajudou a popularizar bonés ao ser frequentemente fotografado com um boné do Banco Nacional, ressalta como esta peça se tornou um ícone fashion.
A política também se aproveitou do potencial comunicativo dos bonés. Nas campanhas dos anos 1990, a peça era largamente utilizada para promover candidatos. Atualmente, com a tendência crescente de personalizações, como demonstrado nas campanhas de candidatos recentes, sua importância política se reafirma. Exemplos de bonés do candidato Pablo Marçal revelam como uma simples peça pode atrair atenção e gerar identificação.
O uso dos bonés como meio de propagação ideológica é respaldado pela sua visibilidade e versatilidade. Segundo a professora de design de moda Naomi Nagamatsu, eles ocupam um lugar proeminente na interação social. Gustavo Berti completa afirmando que "é impossível pensar no Donald Trump sem o boné", exemplificando como a peça se tornou uma extensão de sua marca pessoal e políticas.
No Brasil, o boné do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) é um marco de pertencimento e identidade política. Além disso, a crescente demanda por bonés alusivos a figuras da cultura, como no caso do boné com a frase de Fernanda Torres, indica como essas peças fomentam conexões emocionais e coletivas entre os indivíduos.
Embora especialistas, como Gustavo Berti, ressaltem que o boné funciona como um agregador de ideias e unificadora de grupos, a sua breve memória e adaptabilidade mantêm essa peça viva nas diferentes esferas da sociedade. À medida que mais e mais pessoas optam por expressar suas ideologias através de bonés, a peça continua a se adaptar às tendências sociais. No entanto, uma coisa é certa: o boné nunca sai de moda e sua função vai muito além da proteção contra o sol.
Se você também é fã de bonés e se interessa pela relação entre moda e política, compartilhe suas opiniões e experiências nos comentários. Que mensagens você gostaria de ver estampadas em um boné? Vamos conversar!