Uma investigação realizada por pesquisadores do Instituto de Ciência e Tecnologia da Universidade Estadual Paulista (Unesp) revelou que o uso de vape impacta significativamente a saúde bucal de jovens adultos. A análise, focada em indivíduos com idades entre 25 e 27 anos, revelou que o cigarro eletrônico altera a composição da saliva e eleva o risco de doenças bucais, incluindo a doença periodontal, cáries e lesões na mucosa.
Participaram do estudo 50 indivíduos, dos quais 25 eram usuários regulares de vape há pelo menos seis meses. A outra metade não utilizava cigarros eletrônicos nem cigarros tradicionais. Embora nenhuma alteração visível tenha sido identificada na mucosa oral dos participantes, foram observados "problemas" já existentes em alguns deles antes do início da pesquisa. Surpreendentemente, apenas 25% dos usuários de vape eram ex-fumantes de cigarros convencionais. Os sabores preferidos entre os usuários eram predominantemente frutados e mentolados.
Além da equipe da Unesp, o estudo contou com a colaboração de cientistas da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade de Santiago de Compostela, na Espanha. Os resultados dessa pesquisa foram publicados na renomada revista International Journal of Molecular Sciences.
Durante o estudo, todos os participantes foram submetidos a coletas de saliva, possibilitando a avaliação da viscosidade, pH e níveis de cotinina. A cotinina é um biomarcador que indica a exposição à nicotina; quanto maior a quantidade, maior a chance de dependência. Os pesquisadores também avaliaram parâmetros como frequência cardíaca, oximetria, glicemia e níveis de monóxido de carbono (CO) no ar exalado.
Os resultados mostraram que o fluxo salivar dos usuários de vape era inferior ao do grupo de controle, possivelmente devido à presença de propilenoglicol e glicerina nos aromatizantes. Essas substâncias são conhecidas por irritar as vias respiratórias e causar o ressecamento das mucosas, impactando a saúde da boca. A professora Janete Dias Almeida, coordenadora do estudo, explica: “A redução do fluxo salivar favorece a formação de biofilme, que é a película que se forma quando não fazemos a higiene adequada dos dentes, favorecendo o surgimento de doenças relacionadas à boca, como lesões de cárie.”
Além disso, a viscosidade da saliva dos usuários era reduzida, o que compromete tanto a proteção quanto a hidratação das mucosas. Outras alterações preocupantes incluíram um aumento nos níveis de monóxido de carbono exalado e uma diminuição na saturação de oxigênio. “Esse dado é muito importante, porque a redução da oximetria significa que há menos oxigênio carreado no sangue pelas hemoglobinas”, comenta a cirurgiã-dentista Almeida.
O estudo também identificou a presença de metabólitos como ácido esteárico, ácido elaídico, valina e ácido 3-fenilático, que são mais predominantes na saliva de usuários de vape. Essas descobertas poderão auxiliar em investigações futuras sobre os riscos associados ao uso do cigarro eletrônico.
Além da alteração na composição da saliva e do aumento do risco de doenças bucais, os riscos associados ao uso de vapes incluem complicações pulmonares severas. O cigarro eletrônico é conhecido por provocar lesões agudas nos pulmões e agravar condições associadas ao fumo convencional, como asma e Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC). Além disso, encaminha o usuário a um maior risco de infarto e potencial cancerígeno, dependendo das substâncias presentes nos cartuchos.
Em virtude desses riscos à saúde pública, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) proibiu a comercialização e o consumo de cigarros eletrônicos no Brasil desde 2009. Contudo, a fiscalização continua sendo um grande desafio, especialmente diante do aumento no número de usuários.
Essa pesquisa destaca a importância de se conhecer os efeitos a longo prazo do uso de vapes, não só na saúde bucal, mas também nas condições gerais de saúde dos usuários. O conhecimento e a conscientização sobre esses riscos são essenciais para a promoção de hábitos saudáveis entre a população.