Insatisfeitos com a perda de protagonismo das comissões temáticas na Câmara, deputados da base governista e da oposição querem um compromisso de Hugo Motta (Republicanos-PB) para fortalecer esses colegiados. O esvaziamento das comissões tem irritado parlamentares porque limita a influência sobre o andamento de projetos e reduz a possibilidade de promover debates públicos e de se comunicar com suas bases eleitorais. A insatisfação aumentou após o fim da pandemia, já que, mesmo com o retorno dos trabalhos presenciais, Lira esvaziou a tramitação de projetos nas comissões, priorizando votações diretas no plenário em regime de urgência.
Na prática, conforme relatos de deputados ouvidos reservadamente pela CNN, projetos sem urgência ficam parados na Câmara. Entre os projetos que seguiram direto para votação em plenário, estão propostas de contenção de gastos enviadas pelo governo ao Congresso no final de 2024. Além disso, os presidentes das comissões, que antes eram procurados por todos os partidos políticos, perderam o controle da pauta. Com a movimentação de projetos diretamente para o plenário, o presidente da Câmara aumenta o poder dos relatores, resultando em uma situação de imprevisibilidade na Casa, onde muitas vezes os pareceres eram apresentados minutos antes da análise no plenário.
Deputados também apontam uma queda na qualidade do debate e um desperdício de recursos públicos, visto que as comissões contam com quadros técnicos e estrutura de funcionários públicos concursados. Atualmente, há clamor tanto da base governista quanto da oposição para que Hugo Motta, que é o favorito à sucessão de Lira, revise essa dinâmica e fortaleça os colegiados. O entendimento é que Motta pode ter um estilo menos centralizador e mais aberto ao diálogo, promovendo a retomada do protagonismo das comissões.
Aliados de Motta afirmam que existe uma concordância de que as comissões precisam “funcionar mais”. A disputa por postos de comando das comissões é intensa entre os partidos, e esses cargos são parte de acordos relacionados à eleição da Câmara.
Além disso, os deputados ressaltam que decisões recentes do ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), fortaleceram o papel desses colegiados. A interpretação é de que as chamadas “emendas de comissão” (conhecidas pela sigla RP8) devem ser decididas pelos parlamentares do colegiado antes de serem enviadas. Parte desses recursos foi bloqueada no ano passado, após um pedido do PSOL, e o ministro exigiu as atas das comissões em que as emendas foram decididas. Contudo, as atas não existiam, uma vez que o colegiado de líderes decidia a alocação de recursos sem aprovação das comissões, levando o STF a suspender os repasses por falta de rastreabilidade e transparência.
Essas emendas foram ampliadas desde o orçamento de 2023, após a decisão da Corte que pôs fim ao “orçamento secreto”. As RP9, conhecidas como “emendas do relator”, foram consideradas inconstitucionais pelo STF em 2022.
Outro fator que pode influenciar a importância das comissões na nova legislatura é a reorganização do governo com o Congresso, que pode vir a ocorrer em uma possível reforma ministerial. Parlamentares acreditam que se o Palácio do Planalto conseguir ajustar a distribuição de ministérios para garantir mais apoio no Legislativo, especialmente do centro político, a responsabilidade das comissões temáticas será proporcionalmente maior. Nesta perspectiva, esses colegiados podem ter uma participação fundamental na articulação de projetos que são do interesse do governo.
A centralização de gestões no Congresso também provocou reações de movimentos da sociedade civil. A coalizão Pacto pela Democracia, composta por mais de 200 instituições, lançou um documento intitulado “Câmara Aberta”, que contém pedidos de mudanças. A conclusão desse movimento é que houve uma significativa centralização das decisões, que reduziram a transparência e a participação, tanto social quanto dos parlamentares. O documento, que clama por uma agenda de reformas no regimento interno do legislativo, enfatiza a necessidade de fortalecer as comissões, assegurando que tenham maior autonomia e cumpram efetivamente seu papel de discutir e analisar os projetos antes de sua deliberação no plenário.