O Superman, ícone dos quadrinhos modernos, foi criado em 1938 por Jerry Siegel e Joe Shuster, e não apenas se destacou como o primeiro super-herói, mas também refletiu as ansiedades sociais de seu tempo.
Este personagem surgiu no contexto da Grande Depressão, servindo como um símbolo da resistência dos trabalhadores contra os abusos do poder. As primeiras narrativas do Superman ilustravam sua luta contra a corrupção política, exploração trabalhista e desigualdade social, princípios que o tornaram querido por muitos.
Porém, ao longo dos anos, sua imagem passou por transformações que o alinhavam de forma mais estreita ao establishment, abandonando suas raízes progressistas e se tornando um dos rostos mais rentáveis do entretenimento.
Criação e os Direitos do Personagem
Siegel e Shuster, jovens imigrantes judeus em Cleveland, conceberam a ideia de um herói com habilidades excepcionais dedicado a proteger os indefesos. No entanto, enfrentando dificuldades financeiras, venderam os direitos do Superman por apenas 130 dólares para a Detective Comics, que mais tarde se tornaria a DC Comics.
Com o potencial reconhecido rapidamente pela editora, Superman se transformou em um fenômeno cultural. Enquanto a DC acumulava riquezas com quadrinhos, brinquedos e filmes, seus criadores ficaram sem recompensas financeiras, royalties ou participação nos lucros.
Após várias tentativas de reconquistar os direitos do personagem, Siegel e Shuster enfrentaram um sistema jurídico que frequentemente favorecia as grandes corporações. Somente na década de 70, com a ascensão do Superman no cinema e na TV, os criadores receberam uma pequena compensação da Warner Bros., que havia adquirido a DC Comics.
Da Luta Social ao Emblema Capitalista
O Superman no início de sua trajetória era um verdadeiro defensor do povo, enfrentando empresários exploradores e políticos corruptos. Uma de suas primeiras aventuras destacava sua luta contra um fabricante de armas que se aproveitava da guerra, obrigando um empresário a experimentar as mesmas dificuldades que seus funcionários.
Entretanto, com a evolução dos quadrinhos como uma indústria do entretenimento, a DC percebeu que o Superman poderia ser mais do que um símbolo de justiça social — ele poderia ser uma fonte abundante de lucros. O herói gradualmente tornou-se um ícone do conservadorismo americano, associado à bandeira dos Estados Unidos e à defesa do status quo.
Na década de 80, a obra de Frank Miller, "O Cavaleiro das Trevas", acentuou essa mudança ao retratar o Superman como um agente do governo, contrastando-o com um Batman rebelde. O herói que outrora desafiava as elites agora existia para protegê-las.
James Gunn e os Desafios Legais
Com James Gunn à frente do novo filme do Superman, programado para estrear em 11 de julho de 2025, a ansiedade em torno do retorno do personagem aos cinemas é palpável. Contudo, desafios legais e éticos ainda cercam a franquia.
Desde os anos 2000, os herdeiros de Siegel e Shuster buscam recuperar uma parte dos direitos sobre o Superman, resultando em acordos judiciais que garantem 50% dos direitos sobre as histórias criadas pelos autores. Porém, a Warner Bros. mantém o controle sobre adaptações cinematográficas e produtos derivados, assegurando que o Superman continue sendo um ativo valioso.
Recentemente, Mark Peary, sobrinho de Joe Shuster, tentou anular os direitos da Warner em países como Reino Unido, Canadá e Austrália, argumentando que os direitos autorais deveriam expirar 25 anos após a morte do criador, conforme a legislação britânica. A Warner, no entanto, defende que um acordo de 1992 já resolveu a situação. O resultado desse processo pode impactar a distribuição do novo filme, enquanto o estúdio luta para manter seu controle sobre o personagem.
A Indústria dos Quadrinhos e a Exploração dos Criadores
A história do Superman é um exemplo da exploração sistêmica de artistas pela indústria dos quadrinhos. Autores como Jack Kirby e Bill Finger também enfrentaram situações análogas, onde suas contribuições foram, muitas vezes, subestimadas ou ignoradas.
Alan Moore, autor de clássicos como "Watchmen" e "V de Vingança", criticou veementemente esse modelo de negócios, enfatizando que a indústria funciona como uma fábrica onde os criadores não possuem direitos sobre suas criações, enquanto as grandes editoras lucram perpetuamente.
A luta de Siegel e Shuster se tornou um símbolo dessa injustiça, evidenciando como a cultura pop, ao longo dos anos, se apoderou de um personagem inicialmente criado para desafiar o poder, transformando-o em parte de um sistema que oprime os próprios criadores.
O Legado do Superman
Ainda que enfrente desafios legais e contenha variações ao longo das décadas, o Superman permanece como um dos personagens mais icônicos da história. Sua jornada reflete não apenas a evolução dos quadrinhos, mas também as mudanças sociais e políticas nos Estados Unidos e no mundo.
Agora, com James Gunn no comando do novo filme, resta a dúvida: será que o Superman retornará como um símbolo de justiça e esperança para todos, ou continuará representando os interesses corporativos que moldaram sua narrativa nas últimas décadas?