A cúpula do Exército brasileiro acredita que, apesar da citação de 23 militares na denúncia sobre a tentativa de golpe de Estado, a instituição foi preservada no relatório apresentado pelo procurador-geral da República, Paulo Gonet. Um dos principais pontos ressaltados por oficiais generais, que pediram reserva, é que "o próprio Exército foi vítima de uma conspirata".
Na sua manifestação, Gonet menciona os ataques que generais e seus familiares sofreram por terem resistido a medidas antidemocráticas com o intuito de manter o ex-presidente Jair Bolsonaro no poder. “É de se observar que o Exército foi vítima da conspirata. A sua participação no golpe foi objeto de constante procura e provocação pelos denunciados. Os oficiais generais que resistiram às pressões dos sediciosos enfrentaram uma campanha pública de ataques pessoais, atingindo até seus familiares. Essas contínuas agressões morais tinham como objetivo coagi-los a se juntarem ao movimento rebelde, sempre utilizando um falso sentimento de patriotismo que a organização criminosa explorava,” afirma um trecho da denúncia.
Além disso, o procurador destaca a postura de membros do Alto Comando do Exército, que não cederam aos apelos para a realização de um golpe. “A decisão dos generais, especialmente dos que comandavam diversas Regiões, e do Comandante do Exército de se manterem dentro de seus papéis constitucionais foi essencial para que o golpe, mesmo que tentado, não prosperasse,” acrescenta Gonet.
Na época dos acontecimentos, o então comandante do Exército era o general Marco Antonio Freire Gomes. O atual chefe da Força, general Tomás Paiva, estava à frente do Comando Militar do Sudeste e foi um dos alvos de ataques nas redes sociais. De acordo com oficiais, áudios que foram divulgados pela Polícia Federal ajudam a preservar a imagem do Exército e a responsabilizar individualmente os instigadores de um possível golpe.
Um dos áudios obtidos pela PF é do tenente-coronel Sergio Ricardo Cavaliere de Medeiros, que conversa com o tenente-coronel Mauro Cid, então ajudante de ordens de Bolsonaro. Neste áudio, Cid menciona que "não vai ter nada" porque "o Alto Comando não quer encampar a ideia".
“Meu amigo, tá um show de desinformação. Acabei de falar com o Cid, ele disse que não vai ter nada. Está tudo pronto, mas não vai assinar por conta disso que eu te falei, o Alto Comando está rachado e não quer encampar a ideia. Agora, se tem algo acontecendo e o Cid tá me operando, não sei, pode ser também. Mas ele falou que não vai ter nada, não vai rolar nada, e ele está com o cara o tempo todo,” comenta Medeiros.
Outro ponto em que o coronel Bernardo Romão Corrêa Netto também menciona foi a resistência das Forças Armadas e o receio de que o ex-presidente fosse preso: “O que que está rolando aí, velho? Eu falei com o Cid hoje… Cid afirmou: ‘Pô, pode esquecer que não vai rolar nada, não’. Ele disse: ‘Ó, cara, pode esquecer, não deve… O decreto não vai sair. O presidente não vai fazer. Só faria se tivesse o apoio das Forças Armadas, porque ele está com medo de ser preso. Se acontecer alguma coisa, vai ser preso e o caramba e tal. Não vai soltar nada, não’. Falei com ele agora de manhã. O que está acontecendo de novidade por aí?”, relatou Corrêa Netto em conversa com o tenente-coronel Fabrício Moreira de Bastos, que atuava no Centro de Inteligência do Exército.
Entre os 24 militares denunciados, apenas um pertence à Marinha, o almirante Almir Garnier, ex-comandante da Força. Todos os demais são do Exército, incluindo seis generais, como os ex-ministros Walter Braga Netto e Augusto Heleno, além do número 2 da Secretaria-Geral da Presidência, Mário Fernandes. Informações apuradas pela CNN indicam que a tendência no Exército é que apenas após o término do julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) a Força deve iniciar procedimentos internos para apurar as infrações.
Se todos os denunciados forem considerados réus, os militares ficarão sub judice, o que significa que não terão direito a promoções, movimentações ou transferências.