Nas últimas semanas, declarações de Donald Trump têm levantado preocupações sobre a continuidade do apoio dos Estados Unidos à Ucrânia. Durante sua campanha, o ex-presidente cultivou uma admiração notável por Vladimir Putin, manifestando a intenção de revisar ou até mesmo reduzir a assistência militar concedida a Kiev. Para o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, essa mudança não representa apenas uma troca de governo nos EUA, mas pode ser uma mudança decisiva que altere o rumo do conflito para sempre.
Dentro deste contexto, aliados de Zelensky delineiam pelo menos três possíveis cenários que podem se desdobrar. O primeiro e mais temido pelos ucranianos seria um corte significativo na ajuda militar, acompanhado de pressões para que Kiev aceitasse um acordo de paz desfavorável, que oficializaria algumas das conquistas territoriais russas. Nesse primeiro cenário, Trump, fiel à sua política de “América em Primeiro Lugar”, deixaria claro que não financiará “guerras de terceiros”, transferindo a responsabilidade para os países europeus. Isso obrigaria Zelensky a lidar com a Rússia praticamente sozinho, ou com um suporte ocidental reduzido.
O segundo cenário possível envolve um apoio condicionado, que dependeria de longas negociações no Congresso dos Estados Unidos e exigências de maior colaboração europeia. Nesse caso, haveria ainda alguma liberação de recursos, embora sujeitos a restrições e cobranças sobre reformas internas em Kiev. A pressão bipartidária no Capitólio e o lobby da indústria de defesa poderiam garantir um fluxo limitado de ajuda militar, enquanto se buscaria uma participação mais robusta dos países da Otan. Embora desconfortável, essa alternativa ainda representaria uma saída menos negativa para Zelensky, permitindo-lhe resistir à agressão russa, mesmo que a ajuda fosse menor e menos previsível.
Por outro lado, Zelensky realmente anseia pelo terceiro cenário. Nele, apesar da retórica agressiva e favorável a Putin de Trump, a máquina governamental dos EUA — incluindo o Pentágono, as agências de inteligência e alguns setores do Congresso — conseguiria garantir a manutenção de um nível de assistência militar. Nesse cenário, a ajuda não seria cortada abruptamente e haveria espaço para negociações que moderassem os impulsos isolacionistas do novo presidente. Zelensky compreende a burocracia interna dos EUA e as vozes republicanas mais duras em relação à Rússia, e vê nesse panorama a melhor oportunidade para que haja alguma forma de cooperação contínua.
Com pouco mais de um mês após a posse de Trump, as tendências se inclinam para o primeiro cenário. As declarações cada vez mais enfáticas do presidente sobre “não investir em conflitos de terceiros enquanto os Estados Unidos enfrentam dificuldades internas”, somadas ao seu apoio demonstrado a Putin, sugerem que suas promessas de campanha estão se tornando realidade. Com assessores que compartilham de sua visão isolacionista, Trump já expressou a necessidade de se chegar a um “acordo rápido” na Ucrânia — com ou sem a aprovação de Kiev.
Assim, Zelensky se vê diante de uma situação em que o primeiro cenário, que antes parecia um mero risco, agora se aproxima perigosamente da realidade. Caso isso se concretize, o governo ucraniano precisará buscar urgentemente novos apoios, seja através de acordos bilaterais com países europeus ou por meio de uma articulação mais robusta na União Europeia. O grande desafio será manter a resistência no campo de batalha enquanto lidam com a pressão para aceitar um “cessar-fogo” que poderia ser mais vantajoso para a Rússia do que para a Ucrânia.
Em resumo, a reeleição de Trump e sua administração redirecionam a política externa dos Estados Unidos, distanciando-se do apoio a Kiev e criando um fosso entre os interesses da Casa Branca e as necessidades de segurança da Ucrânia. O que Zelensky esperava uma retórica firme, mas com continuidade no apoio, dá espaço para o pior: um corte significativo nos repasses financeiros e a ameaça iminente de um acordo imposto por Moscou. No complexo cenário internacional, o presidente ucraniano encontra dificuldades para preservar a soberania do seu país e convencer o Ocidente de que a liberdade de seu povo não deveria ser tratada como um mero acordo entre Estados Unidos e Rússia.