Nos últimos dias, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, tem intensificado seu discurso sobre a necessidade de implementar tarifas sobre produtos importados. Segundo ele, essa abordagem visa adotar tarifas recíprocas, onde as taxas aplicadas às importações serão semelhantes às tarifas que outros países impõem sobre os produtos que importam dos EUA, o que inclui empresas brasileiras.
Trump alega que muitos países aplicam tarifas que são significativamente mais altas do que aquelas cobradas pelos americanos e observa que os EUA "foram tratados injustamente por parceiros comerciais, amigos ou inimigos". A BBC, através da sua divisão Verify, buscou investigar as declarações do presidente e a realidade do comércio internacional.
Para compreender melhor a questão, é fundamental examinar como os países definem suas tarifas de importação. De acordo com as regras da Organização Mundial do Comércio (OMC), os países têm permissão para impor tarifas em seus produtos. Essas taxas variam de acordo com o tipo de produto. Por exemplo, um país pode aplicar 10% sobre arroz e até 25% sobre veículos. Contudo, de acordo com a OMC, as tarifas não devem discriminar entre os países. Assim, o Egito não pode criar uma tarifa de 2% sobre trigo da Rússia e, ao mesmo tempo, uma tarifa de 50% sobre o trigo da Ucrânia — isso fere o princípio da "Nação Mais Favorecida".
As tarifas médias de importação variam consideravelmente entre os países. Cada nação apresenta uma tarifa externa média, que é reportada à OMC. Dados de 2023 mostram que o Brasil possui uma das tarifas externas médias mais elevadas do mundo, com 11,2%. Em contraste, os Estados Unidos tinham uma tarifa externa média de apenas 3,3%, que é inferior à média da União Europeia (5%) e da China (7,5%). Embora esses números indicam que a tarifa média dos EUA é consideravelmente menor em comparação a alguns parceiros comerciais — como a Índia, com 17%, e a Coreia do Sul, com 13,4% — a taxa dos EUA é também menor em relação ao México (6,8%) e ao Canadá (3,8%), devido a acordos comerciais que eliminam tarifas sobre as exportações americanas.
Ainda assim, a afirmação de Trump de que alguns países apresentam tarifas médias mais elevadas que os EUA é legítima, pois essas taxas encarecem as exportações americanas, criando uma aparente desvantagem para os exportadores dos EUA em relação à concorrência.
No entanto, é importante destacar que a maioria dos economistas concorda que os custos associados às tarifas de importação acabam sendo arcados pelos consumidores do país que impõe as taxas. Na prática, isso significa que países com tarifas médias mais altas que os Estados Unidos podem estar penalizando seus próprios consumidores, em vez de afetar diretamente os americanos.
Recentemente, Trump mencionou que sua ideia de tarifas recíprocas significaria que os EUA aplicariam a mesma tarifa média imposta por outros países sobre as importações americanas. Ele foi claro ao afirmar: "Se eles nos cobrarem, nós cobraremos deles. Se eles estiverem em 25%, nós estaremos em 25%. Se estiverem em 10, nós estaremos em 10". Essa abordagem, no entanto, pode violar os princípios da OMC, que exigem tratamento igual para todas as nações.
Teoricamente, se os EUA decidissem igualar a tarifa média de importação a de cada nação, isso poderia gerar uma grande complexidade. Por exemplo, se os Estados Unidos impusessem uma tarifa de 9,4% sobre produtos do Vietnã, mas 3,8% sobre produtos do Reino Unido, essa diferença poderia abrir brechas para questionamentos sobre a legalidade dessa ação nos organismos internacionais.
Trump também sugeriu que as tarifas recíprocas poderiam ser desenhadas para compensar barreiras não tarifárias ao comércio. No entanto, isso adiciona uma camada de complexidade ao equilíbrio tarifário global, uma vez que muitos países, incluindo o Brasil, estão em processo de reformar suas estruturas tributárias, como a implementação do Imposto sobre Valor Agregado (IVA).
Os EUA atualmente impõem tarifas mais altas sobre produtos agrícolas específicos do que em outros países. Um exemplo é a tarifa efetiva de mais de 10% sobre as importações de leite, enquanto a Nova Zelândia, um grande exportador de laticínios, aplica 0%. Essa configuração é um reflexo das prioridades políticas e da proteção de indústrias domésticas, especialmente em estados chave como Wisconsin.
Se Trump realmente buscasse uma igualdade tarifária genuína, haveria a necessidade de rever algumas das tarifas existentes para evitar desvantagens competitivas. Um regime de tarifas recíprocas por produtos específicos, embora teoricamente interessante, poderia se tornar um pesadelo logístico, considerando a variedade de bens e as diferentes tarifas aplicadas por multiplicidade de países.
Embora a proposta de Trump para a implementação de tarifas recíprocas possa parecer um esforço por justiça no comércio internacional, as suas implicações são complexas e podem trazer mais dificuldades para a economia americana. A discussão sobre como planejar essas tarifas deve levar em conta tanto as relações comerciais já estabelecidas quanto os impactos diretos sobre consumidores e produtores. Acompanhar o desenrolar dessa situação é crucial, e os cidadãos devem continuar engajados nas discussões sobre políticas comerciais que afetam o país.