Márlon Reis, considerado o "pai" da Lei da Ficha Limpa, expressou sua preocupação com as recentes tentativas de alteração dessa legislação, em meio ao debate sobre a inelegibilidade do ex-presidente Jair Bolsonaro. Para ele, essa mudança representa uma "reação desesperada" dos aliados de Bolsonaro, que buscam reverter a inelegibilidade de oito anos imposta ao ex-presidente, devido a condenações por abuso de poder político.
A Lei da Ficha Limpa, em vigor desde 4 de julho de 2010, é um marco significativo na história política brasileira. Em comemoração aos seus 15 anos, está em discussão na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados um Projeto de Lei Complementar (PLP 141/2023), apresentado pelo deputado Bibo Nunes (PL-RS), que visa reduzir o período de inelegibilidade de oito para apenas dois anos.
No projeto, Nunes justifica essa mudança dizendo que a sanção de dois anos é "mais do que suficiente para os fins que se almeja a inelegibilidade". Além dele, outros 72 deputados assinaram como co-autores, e a proposta aguarda um parecer do deputado federal Filipe Barros (PL-PR). Paralelamente, o deputado Hélio Lopes (PL-RJ) apresentou um projeto que sugere a exigência de condenação penal para que a inelegibilidade por abuso de poder seja aplicada, além de limitar a perda de direitos políticos em casos de improbidade administrativa.
Reis argumenta que essas alterações podem comprometer a credibilidade do sistema eleitoral no Brasil. "Mudar as regras do jogo em função de uma pessoa deslegitima um país. Está claro que ninguém mais confia na existência de um sistema se isso acontecer. A previsibilidade e a segurança jurídica são fundamentais", ressalta.
Ele destaca que a Lei da Ficha Limpa surgiu de um esforço popular significativo, reunindo mais de 1,6 milhão de assinaturas e o apoio de várias entidades, como o Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE). Para Reis, adicionar a possibilidade de revisão do tempo de inelegibilidade desconsidera o propósito original da lei e abre precedentes perigosos.
Reis também observa que a tentativa de revisão da lei é uma forma que Bolsonaro e seus aliados encontraram para postergar a definição de um novo candidato da direita para as eleições de 2026. "Eles estão em uma situação da qual não conseguem escapar, que é a inelegibilidade de Bolsonaro. À medida que a eleição se aproxima, é imperativo que a direita escolha um candidato, e isso não pode ser ele", afirma.
Recentemente, Bolsonaro insinuou que a Lei da Ficha Limpa é usada para perseguir a direita, mas Reis refuta essa alegação, afirmando que a legislação foi criada sem a intenção de beneficiar ou prejudicar alguém em particular. "Ela foi criada para uma questão maior, que é a integridade do processo eleitoral. A inelegibilidade de Bolsonaro é resultado da combinação de fatores que se concretizaram após a promulgação da lei", explica Reis.
Ele salienta que, antes da implementação da Lei da Ficha Limpa, a inelegibilidade tinha um prazo de três anos e somente era aplicada a quem ganhasse uma eleição, o que permitia que muitos fossem beneficiados, mesmo se suas ações durante a campanha fossem questionáveis.
Reis finaliza enfatizando que essa tentativa de alteração não apenas beneficiaria Bolsonaro, mas atacaria a essência da Lei da Ficha Limpa. "É um evidente casuísmo que, se permitido, colocaria em risco a própria estrutura do sistema eleitoral", conclui.