Um trágico ataque ocorreu em um assentamento do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) em Tremembé, interior de São Paulo, resultando em dois mortos e seis feridos. O incidente se deu em meio a uma reunião da comunidade, que buscava discutir o desaparecimento de uma bomba de água crucial para a sobrevivência do assentamento Olga Benário.
De acordo com os residentes, homens armados, em carros e motos, cercaram a área e dispararam tiros aleatórios. "Foi algo muito rápido, já chegaram atirando. Eles montaram um cerco. Vi armas de fogo e ouvi os tiros. Foram incontáveis. Parecia filme de terror mesmo, não paravam de atirar", relatou Roseli Ferreira Bernardo, uma moradora de 49 anos.
A situação se agravou para Roseli, que acabou sendo ferida no pé e percebeu que estava sangrando. Sua filha, Olga Bernardo, de 18 anos, também foi atingida na mão durante o ataque. O ataque brutal deixou Valdir do Nascimento de Jesus, de 52 anos, e Gleison Barbosa de Carvalho, de 28 anos, mortos.
Carmem Faria, viúva de Valdir, mencionou o apoio comovente recebido da comunidade logo após o ataque. "A gente vem recebendo muito apoio, muita ajuda do movimento. Muitas pessoas vieram até o assentamento, fizeram vigília, pois o Valdir foi a vida toda um militante", compartilhou Carmem.
Após a tragédia, as autoridades locais apontaram que a investigação inicial sugeria uma disputa por terras como motivação do ataque. Um suspeito foi detido. Entretanto, Carmem argumenta que há questão mais profunda ligada à propriedade, indicando potencial interesse em utilizar as terras para especulação imobiliária.
A Secretaria de Segurança Pública de São Paulo afirmou que "as investigações continuam em andamento" e que estão sendo realizadas diligências para esclarecer todos os fatos. A gravidade do ataque despertou a atenção nacional, levando o Ministério da Justiça a solicitar uma investigação da Polícia Federal sobre o caso.
Moradores do assentamento sentem que essa violência representa um aumento na hostilidade que o MST enfrenta. "A gente sente esse aumento do ódio. Ouvimos comentários na rua, na escola... Esse tipo de preconceito está sempre presente. Mas não vamos sair daqui", garantiu Roseli.
A questão agrária no Brasil é histórica e complexa. Desde a formação do campesinato brasileiro, o conflito pela posse da terra tem raízes profundas. O MST, que se organizou na redemocratização, busca lutar pela reforma agrária, um tema que se tornava cada vez mais relevante após os anos de ditadura militar, que exacerbou a concentração de terras.
Segundo Bernardo Mançano Fernandes, professor da Unesp, essa luta enfrenta desafios contínuos, especialmente em face da crescente oposição de setores conservadores da sociedade. "O movimento camponês está sempre lutando contra a propriedade capitalista, e essa luta nunca é fácil", observou ele.
Embora o MST tenha conquistado avanços significativos, como a implementação do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), a resistência continua. A queda drástica no número de áreas adquiridas para novos assentamentos, que antes somavam 13 milhões de hectares, é um indicativo do retrocesso na política agrária.
Em resposta à inércia governamental, o MST se adaptou, mudando sua estratégia de luta. Movimento tem buscado maior aproximação com as populações urbanas e explorado práticas sustentáveis, como a agroecologia. Gilmar Mauro, membro da Coordenação Nacional do MST, enfatizou que merecem atenção os novos modelos de agricultura por conta da mudança no contexto socioeconômico.
As vozes no assentamento Olga Benário revelam um compromisso inabalável com a luta: "Não podemos deixar o movimento parar. Agora é organizar o MST na região e continuar a luta pelos nossos direitos", concluiu Carmem Faria.