Nos primeiros dias desde que voltou à Casa Branca, o presidente americano, Donald Trump, tem sinalizado uma política externa mais imperialista do que isolacionista, pelo menos na retórica, na avaliação de especialistas consultados pela BBC News Brasil. Diversas ações e declarações recentes do republicano remetem ao imperialismo americano do século 19, quando os Estados Unidos não apenas se expandiram para o Oeste, mas também ocuparam territórios distantes.
Em coletiva de imprensa no início do mês, antes mesmo de iniciar seu segundo mandato, Trump cogitou comprar a Groenlândia (território autônomo da Dinamarca, país aliado dos Estados Unidos) e o Canal do Panamá, e não descartou o uso de força militar ou pressão econômica para atingir o objetivo. Disse ainda que o Canadá deveria ser um Estado americano e sugeriu "se livrar da linha traçada artificialmente" na fronteira entre os dois países.
Durante o discurso de posse no Capitólio, Trump elogiou o presidente William McKinley (1897-1901), que é lembrado pela vitória na Guerra Hispano-Americana (1898) e pelo expansionismo durante seu governo, quando os Estados Unidos assumiram o controle de Guam, Havaí, Porto Rico, Cuba e Filipinas.
Pouco após a cerimônia, já no Salão Oval, Trump assinou uma série de ordens executivas, entre elas uma que instrui o governo federal a mudar o nome do Golfo do México para "Golfo da América". É possível que as declarações de Trump sejam apenas táticas de negociação, semelhantes às empregadas em várias situações durante seu primeiro mandato (2017-2021).
Independentemente de suas reais intenções, essa retórica faz dele o primeiro presidente dos Estados Unidos em mais de cem anos a defender a expansão territorial do país. "Ele até usou o termo destino manifesto, que é um tipo de declaração imperialista e expansionista", diz à BBC News Brasil o cientista político Todd Belt, professor da George Washington University, em Washington.
O slogan "America First" foi adotado por Trump desde sua primeira campanha, em 2016. Ao concorrer desta vez, o republicano voltou a falar em "rejeitar o globalismo" e acabar com guerras e em um recuo em intervenções no exterior, gerando expectativa de uma política externa mais isolacionista.
A partir de 1823, com a chamada Doutrina Monroe, os Estados Unidos passaram a considerar a América Latina como sua esfera de influência. Ao longo do século 19, o país expandiu seu território ao comprar a Louisiana (da França), a Flórida (da Espanha), o Alasca (da Rússia) e partes do México, além das conquistas após a Guerra Hispano-Americana.
Mesmo que presidentes nas últimas décadas não tenham declarado a intenção de ampliar o território, há o argumento de que a ideologia do destino manifesto se mantém na ambição americana de controlar partes do mundo onde têm interesses, tanto por meio da política externa quanto da economia.
No caso de mudar o nome do Golfo do México, a presidente mexicana, Claudia Sheinbaum, respondeu à proposta dizendo que os Estados Unidos deveriam ser chamados de "América Mexicana". O foco no Canal do Panamá e na Groenlândia, porém, pode ser mais sério. Tanto o governo panamenho quanto o dinamarquês já rejeitaram a ideia de venda.
É comum em Washington que a política externa ganhe mais atenção de presidentes em segundo mandato, quando além de estarem livres da pressão de buscar a reeleição, muitas vezes enfrentam dificuldades para implementar sua agenda doméstica. Trump, porém, não é um político tradicional.
Mas há riscos na retórica imperialista e na sugestão de que os Estados Unidos poderiam até usar a força. Alguns analistas na imprensa americana afirmam que pode ser contraproducente, especialmente em um momento em que a Rússia avança sobre a Ucrânia e a China ameaça Taiwan. "Não acho que isso necessariamente encoraje os inimigos dos Estados Unidos, mas pode afastar os aliados", diz Belt.
Trump sempre pensa em termos de negócios, e suas ações recentes podem refletir essa perspectiva, levantando questões sobre o verdadeiro objetivo por trás de suas declarações. O futuro da política externa americana será moldado pelas decisões de Trump e as reações do mundo em relação a elas.