Os diários íntimos de Joan Didion, descobertos após sua morte, serão lançados em abril com o título "Notes to John". Essas anotações oferecem um olhar profundo sobre suas experiências com ansiedade, culpa e depressão, além de reflexões sobre sua vida e legado intelectual, preenchendo lacunas sobre sua jornada.
A escritora iniciou essa prática em dezembro de 1999, por volta de seu 65º aniversário, após sessões terapêuticas. Durante um ano, Didion registrou conversas que abordavam suas lutas pessoais, incluindo sua relação com a filha e os desafios que enfrentou em sua carreira.
Após o falecimento de Didion em 2021, seus curadores literários encontraram essas anotações no apartamento da autora, em Nova York. Eles descobriram 46 entradas em uma pasta sem identificação, endereçadas ao seu falecido marido, John Gregory Dunne.
Didion não deixou orientações sobre o que fazer com os diários após sua morte, e a existência do material era desconhecida até então. Contudo, seus curadores, incluindo sua agente literária Lynn Nesbit e editores Shelley Wanger e Sharon DeLano, notaram que as anotações estavam organizadas cronologicamente, formando uma narrativa íntima e sem filtros.
O diário será publicado no dia 22 de abril pela editora Knopf em um volume de 208 páginas. Os textos serão apresentados da forma como foram encontrados, com correções de erro de digitação e algumas notas de rodapé para esclarecer o contexto, conforme indica o Didion Dunne Literary Trust. Além disso, os originais estarão acessíveis ao público a partir de 26 de março, na Biblioteca Pública de Nova York.
A obra representa a primeira nova publicação de Didion desde que ela deixou de lançar trabalhos em 2011, uma década antes de seu falecimento.
A editora-chefe da Knopf, Jordan Pavlin, descreveu o diário como "um relato comovente e profundo de uma vida de intenso engajamento intelectual", enfatizando sua vulnerabilidade e a consciência que Didion tinha de sua imagem pública.
Pavlin também comentou que as anotações “preenchem grandes lacunas no entendimento sobre seus pensamentos”, destacando que a essência da arte de Didion sempre incluía o que ela escolhia revelar ou omitir. “[...] ‘Notes to John’ é único na falta de omissões.”
A publicação desse material pode levantar discussões sobre a aprovação de Didion para que suas anotações fossem divulgadas. Embora tenha mantido os documentos organizados e arquivados, Didion nunca mencionou as anotações para sua agente ou editora, nem procurou publicá-las enquanto estava viva. Ela expressou desaprovação em relação à prática de publicar o trabalho inacabado de autores após a morte, considerando-a uma traição aos desejos do autor, como evidenciado em seu ensaio sobre o lançamento póstumo de Ernest Hemingway.
Joan Didion permaneceu uma figura enigmática, admirada por sua visão crítica e pela prosa incisiva. Sua notoriedade se consolidou ao capturar o turbulento cenário cultural das décadas de 1960 e 1970 através de ensaios notáveis encontrados em obras como "Rastejando até Belém" e "O álbum branco".
Ela também explorou sua vida pessoal e dificuldades ao longo de sua carreira. Suas experiências de saúde mental foram reveladas em seu ensaio sobre um ataque em 1968, quando foi diagnosticada com distúrbios. Após a morte do marido, em 2003, escreveu o best-seller "O ano do pensamento mágico", que documentou seu luto.
Essa obra foi seguida por "Noites azuis", onde explorou a dor pela morte de sua filha, Quintana Roo Dunne, que morreu em 2005. Nela, Didion expressou suas ansiedades sobre a maternidade e o envelhecimento e seu temor de não conseguir mais escrever da mesma forma que antes.
Nos escritos encontrados em "Notes to John", os mesmos temas de maternidade, relacionamentos e legado são abordados. As anotações iniciais refletem sobre a adoção, questões relacionadas ao alcoolismo e as complexidades da relação com sua filha.
A obra também contém reflexões sobre sua infância, relação com os pais, os desafios como escritora e suas considerações sobre seu legado literário. Didion endereça diretamente as notas a Dunne, mencionando conversas que tiveram durante as sessões de terapia.
Quando Joan Didion faleceu em dezembro de 2021, aos 87 anos, deixou uma vasta coleção de registros sobre sua vida e obra. Seus arquivos, juntos aos de Dunne, foram doados à Biblioteca Pública de Nova York e são compostos por 354 caixas que contêm fotografias, manuscritos, correspondências, materiais de pesquisa e muito mais.
Por ora, não há planos para a publicação de mais material de seus arquivos, conforme comunicado por Paul Bogaards, porta-voz do Didion Dunne Literary Trust. Contudo, é importante reconhecer que os diários de "Notes to John" representam uma contribuição significativa à compreensão do trabalho de Didion, destacando-se como uma narrativa única que não possui paralelos em seus arquivos.